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O livro dos livros

Histórias e revisão de histórias, por Eliz B. 

31 maio, 2008


O livro das continuações

# iv


Os rapazes tornam-se homens e os homens tornam-se problemas, às vezes rapazes com problemas, porque retrocedem, esperançados em reencontrar o amparo do peito maternal que o crescimento afastou. Isto parece ser um artifício narrativo, mas é uma proposição correspondente aos factos, adæquatio rei et intellectus, demasiado verdadeira para ser boa. Verum e factum. Talvez por isto prefiro os homens, eles (a)traem-me, despertam em mim o instinto de mulher, sem plural, com transpiração. Eu sou difícil, não nego, mas os homens são mais. É mais do que uma questão de atracção, é uma questão de diferença, que tem tanto de naturalidade quanto de fatalidade. A condição feminina transporta a condição trágica, a menstruação, as dores disso, nascemos equipadas para sermos mãe, mesmo aquelas que renunciam à vontade de recriar a humanidade dentro de si. Os homens, esses, são frágeis em todos os sentidos, ainda que eventualmente mais resistentes. Degradam-se e suportam a degradação própria com resignação. Olham em volta, deixam-se estar, tornam-se indíces da indigência e do espectáculo da miséria. Como disse, às vezes transformam-se em rapazes com problemas, tornam-se ainda mais insolentes. Conheço-me, não toleraria repetir-me assim e ser consequência de tal repetição, exposta para os outros. Já me basta a evidência de passear no campo e, enquanto, fumar um cigarro. Não sei porquê, não acredito em revoluções, sou contemplativa.

referência

17 maio, 2008


O livro das continuações

# iii
, do not past

Aquilo que costuma dizer-se é que a arqueologia traz o passado à superfície, entendendo-se a superfície como presente. Mas se, à procura de Maio, levantas e apanhas o chão, reencontras a praia desse mês? Não. Ao abrires passagem até à terra firme, corrida toda a areia, quanto muito encontras o tempo perdido entretanto, um chão pisado muitas vezes, sem que tenha sido evidente como fundamento dos teus passos e dos passos dos outros. É isto o mais exacto que podes servir-te. E não adianta discutir a dimensão das decisões tomadas antes, se pequenas, grandes ou assim assim. O passado, o teu e o dos outros, corre atrás de ti, no teu encalce, adiantando-se ao ritmo do teu avanço e do avanço dos outros, concentrando-se e dissolvendo-se simultaneamente mais do que na tua sombra, na tua carne, sendo-te intimamente estranho. O jogo do tempo é duplo e duplica-te também, em recordações e esperanças, em atraso e envelhecimento, em um só corpo, no qual e pelo qual hás-de viver e continuar a morrer.

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11 maio, 2008


Livrete dos anjos sujos

# xi
. Interessam-me os infortúnios. Uma terceira mão alcançou-o, mão de mulher. Ele recostou-se na cadeira. Às vezes até clamo «viva nada» e satisfaço-me com isso. Fechou os olhos, deixou que ela lhe catasse as plumas. Havia uma almofada quase cheia com sobras de si conseguidas assim. Mas não me parece que tal seja sempre suficiente. Algo não permitia que ele fosse definitivo. Sabes?, ela deixou-me invocando que eu fazia muito vento quando estava em cima dela. Como um cão abana a cauda por satisfação, Fausto Schültz agitava as asas. Não nego, era jovem, vigoroso, entusiasmava-me. Todavia não lhe consegui tirar os três, os três ou os outros, os quatro, os cinco, os seis, os sete. Nenhuma vida é completa, ninguém consegue aproveitar todas as oportunidades. Hoje o meu problema é outro, não sei como é possível ser amante na solidão. Ele soergueu-se e arrumou melhor o corpo na cadeira. O passado perseguia-o, não era um arquivo morto, posto numa gaveta remota. Tentei, confesso, mas não me parece que isso seja possível. Por instantes atentou nos casquilhos dos puxadores das portas do armário. Achas que estou a ficar obcecado? Ela sorriu e preservou o silêncio. Estou, não estou? E um delíquio moral calou-o subitamente. Fausto Schültz era inquilino de dúvidas, um anjo estranho.

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10 maio, 2008


O livro das continuações

# ii
, cinquenta dias depois

Já não abrimos o frigorífico há muito tempo. Dói-nos o cotovelo de tanto levantarmos o braço direito para assinalarmos perfunctória e solenemente a nossa fome. Até é provável que a validade dos iogurtes já tenha expirado. Estamos cansados de passar o pano sobre os jogos psicológicos, sobre as perdas e os ganhos do corpo a corpo, sobre as esperas. Os brinquedos estão a apanhar pó sobre a cómoda, estás a ver?, o napperon está encardido. O tempo está a passar. Deveria haver uma agência de salmos, para que não fosse necessário procurá-los em páginas de papel de bíblia. O tempo passa. Ainda há quem mantenha o olhar embrulhado. Os pés não têm escrúpulos, pisam. Talvez a modernidade esteja a ficar fora de moda. Talvez tenhamos que avançar, subir escadas, assentar melhor os pés sobre as coisas.

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03 maio, 2008


O livro das continuações

# i


Escrevo vezes demasiadas o medo de não conseguir ser justa. Não é um medo deveras mais do que é um escrúpulo. Perturba-me sobremodo a hipótese de não conseguir ponderar escritos, ditos e factos, de falhar a medida e repetir uma escala inferior, uma posição dobrada, estreita ao chão, ofendendo por defeito o que está documentado ou foi feito. Perturba-me de igual modo o excesso, declarar a mais, ultrapassando o arquivo ou o seu motivo. Por desvio menor ou maior, de défice ou acrescentado, falhar é o princípio da oportunidade que permite tentar outra vez, eu sei. Mais do que qualquer outro elemento, a carne não engana ou ilude tal facto. A morte demora, continua, sim. Eu também. Não me recolho, não me esgoto nas costas. Por isso quando desisto é por voto de justiça, por na circunstância sentir errar o calibre que tento, não por cuidado de defesa, instinto de preservação ou temor. Repito, como a morte, eu continuo também.

referência

2006/2022 - Eliz B. (danada composta e padecida por © Sérgio Faria).