03 maio, 2008
O livro das continuações
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Escrevo vezes demasiadas o medo de não conseguir ser justa. Não é um medo deveras mais do que é um escrúpulo. Perturba-me sobremodo a hipótese de não conseguir ponderar escritos, ditos e factos, de falhar a medida e repetir uma escala inferior, uma posição dobrada, estreita ao chão, ofendendo por defeito o que está documentado ou foi feito. Perturba-me de igual modo o excesso, declarar a mais, ultrapassando o arquivo ou o seu motivo. Por desvio menor ou maior, de défice ou acrescentado, falhar é o princípio da oportunidade que permite tentar outra vez, eu sei. Mais do que qualquer outro elemento, a carne não engana ou ilude tal facto. A morte demora, continua, sim. Eu também. Não me recolho, não me esgoto nas costas. Por isso quando desisto é por voto de justiça, por na circunstância sentir errar o calibre que tento, não por cuidado de defesa, instinto de preservação ou temor. Repito, como a morte, eu continuo também.
2006/2022 - Eliz B. (danada composta e padecida por © Sérgio Faria).