26 abril, 2009
O livro das continuações
# xviii
O poder que os quietos têm para vencer a memória faz-me sentir impotente. Sou crescentemente recordações e por elas, incapaz de esquecer. Isto habita-me com a mesma improbabilidade da comunicação e do amor. Não troco a proposição de Luhmann pelo uso do twitter. Não tenho urgências na puta da vida. É muito o que me espera para que, como sorte escrita, eu possa lembrar com vagar o que já esperei. Sou continuando a ser, isto sei. No entanto não sei se, sendo, sou continuação ou sou substituição. ____________________ Conheço um desvio que pode levar-me mais longe. Esse desvio és tu. Começo a crer que foste a desculpa melhor que tive para afastar-me de ti e de mim, sem regressar. Às vezes ainda me sinto perdida, ainda faço gestos que não têm destinatário. Sou capaz de perder-me mesmo diante do espelho, consumida na e pela evidência do reflexo de que sou simultaneamente motivo e testemunha. Acrescento-me ainda com a soberania de que, desde o meu - não o nosso - afastamento, não prescindo. Às vezes ouço vozes, sabes? Sou a senhora delas, a habitação de que precisam.
2006/2022 - Eliz B. (danada composta e padecida por © Sérgio Faria).